Da área vazia e arenosa no início dos anos 20, um novo bairro residencial surge, ainda convivendo com o passado industrial da região.
Na imagem podemos ver, na Rua Fonte da Saudade, no fim do seu trecho reto, a fábrica da David & Cia, que manufaturava Papéis Pintados, e ocupava uma área considerável da região. Os galpões da unidade fabril ocupavam a área hoje ocupada pelas Ruas Alm Guilhobel e Idelfonso Simões Lopes, indo até a entrada da Rua Sacopam, que ainda não era visível no meio da mata do Morro da Saudade embora já estivesse aberta, como sua entrada nos mostra na foto.
A Pequena Cruzada, no mesmo terreno ocupava uma construção muito diferente da atual, e seus terrenos ainda não tinha sido cedidos para outras atividades.
Mais à frente, perto da Curva do Calombo observamos que, ainda haviam pouquíssimos imóveis na Av. Epitácio Pessoa, na foto apenas um pequeno edifício de apartamentos se destaca no meio do verde.
No mesmo ponto, mas subindo a encosta vemos a Rua Tabatinguera ainda na sua condição primitiva, um dos pedaços da Trilha da Catacumba, usada desde tempos imemoriais, primeiro pelos índios e depois na colônia como caminho para os areais de Ipanema e Copacabana.
A foto ainda nos brinda com a parte superior da trilha, bem visível, que se dirigia diretamente à área hoje ocupada pelo Parque da Catacumba.
A fundo a Praça Nicarágua na região da antiga Praia Funda, aos pés do Caminho do Caniço, hoje Rua Gastão Bahiana, e uma Ipanema totalmente ocupada, embora ainda só por casas e edifícios de 3 pavimentos. É interessante observar nas encostas o grande número de pedreiras, indispensáveis há até poucos anos antes para a construção civil.
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Um
passeio pela Rua Fonte da Saudade, onde fica o conjunto de ruas mais
expressivo do bairro da Lagoa, comumente lembrado por duas avenidas de
tráfego intenso e uma bela paisagem.
por Pedro Paulo Bastos
Diz a lenda que por lá se ouviam aos
berros os fados cantados pelas portuguesas lavadeiras recém-chegadas ao
Brasil. Há pelo menos uns dois séculos, acredito. A cantoria era uma
forma saudosa de relembrar a saudosa mãe-pátria, tão distante, lá nas
Zoropa. Outra parte da história diz que por lá havia também uma fonte de água mágica, pura. Eis o nome, Fonte da Saudade. Hoje é um pequeno sub-bairro da Lagoa nas margens do Humaitá e do acesso ao Túnel Rebouças. Diferentemente do passado, não se escutam mais os fados, e sim freadas e buzinas dos automóveis que passam pela avenida adjacente, a Epitácio Pessoa.
O 157, que liga a Gávea à Central do Brasil, entra pela rua num estardalhaço, sendo, talvez, o único ruído de máquina por ali em meio a uma paisagem bastante bucólica. No entanto, concretamente verticalizada.
Eram umas dez horas da manhã. O 157 vai parando nos pontos da Fonte da Saudade, onde embarcam homens trintões-quarentões bem vestidos, a mochila escolar destoando do visual, enquanto mulheres igualmente bem arrumadas – umas mais novas, outras mais maduras – esperam sua vez de subir no veículo. Cavalheirismo não faz mais parte das leis dos pontos de ônibus. É um detalhe dispensável, afinal, o corre-corre nos impede de notar tais sutilezas.
O ônibus vai se afastando, desaparecendo da minha vista ao entrar numa pequena curva à esquerda, onde a Rua Fonte da Saudade ganha pista dupla. O panorama é bonito de ser apreciado: os troncos das árvores são enfeitados por orquídeas predominantemente brancas, e o Palacete Tavares se exibindo ao fundo, na esquina da Rua Almirante Guillobel.
A entrada à Fonte da Saudade através da Avenida Epitácio Pessoa. No seu início, ela conta com uma única pista.
O Palacete Tavares, tombado em 2003, na esquina com a Rua Almirante Guillobel, e o espetáculo de orquídeas que embeleza a rua.
Árvores tomadas por ervas-de-passarinho enquanto edifícios recentes, com traços antigos, dividem espaço com os, de fato, antigos.
Oferecem um visual bonito a este trecho da Lagoa, embora, como todos devem saber, matem pouco a pouco cada uma dessas árvores. Mesmo assim, algumas estão tão desnutridas e envelhecidas que o formato dos seus galhos, na ausência de folhas e flores, se encurva de modo a parecer ora um cabelo de Medusa, ora um outro penteado endoidado. Uma delas, na altura da Rua Sacopã, me lembra o visual da Radical Chic, o personagem de quadrinhos do cartunista Miguel Paiva. A natureza às vezes é mais pop do que a gente imagina.
Todos os edifícios da Rua Fonte da Saudade seguem um padrão exclusivo da classe média alta, com algumas poucas referências antigas desprovidas de garagens. O aspecto modernoso dos seus prédios pode ser compreendido pela considerável presença de casas, como o Palacete Tavares, já citado, entre outras que, na maioria das vezes, funcionam como estabelecimentos comerciais.
No cruzamento da Rua Carvalho Azevedo, duas casas competem em beleza mas complementam-se na vocação – a gastrononomia. O japonês Ki, considerado um dos melhores do Rio, ocupa um imóvel mergulhado em um azul-esverdeado. Do outro lado, a padaria-bistrô Guy, mais adaptado ao comércio, com varandas ao ar livre cobertas por cortinas de plástico transparente e vasos de plantas.
Não só rota para alguns ônibus, a Fonte da Saudade também funciona como via de apoio ao trânsito pesado da região.
Os muros grafitados são figurinhas carimbadas por lá, recheados de intervenções criativas. Ao lado, as babás, cujo uniforme é sempre a roupa de cor branca.
Trecho da Rua Fonte de Saudade, onde funciona um salão de beleza e um pequeno acesso à Rua Baronesa de Poconé. Ao lado, a parte dianteira da Paróquia Santa Margarida Maria.
Agraciado pela arte de rua, o colorido ininterrupto representa caricaturas, dizeres, onomatopeias e assinaturas, que vão se repetir – não em ideias, mas em cores – nos muros mais adiante, perto da Escola Rubem Braga e da Paróquia Santa Margarida Maria. Aliás, na pequenina Rua Frei Solano, onde está a paróquia e mais uma porção de muros grafitados, rola uma feira livre todas as quartas-feiras. Aquele ruído de cana sendo moída é indescritivelmente maravilhoso! O sabor do caldo, ainda mais.
Nas proximidades do Humaitá, a Fonte da Saudade perde um pouco do seu bucolismo para dar espaço às rotas alternativas de acesso à Lagoa e ao Túnel Rebouças. Placas de trânsito tornam-se mais frequentes, assim como outras linhas de ônibus em direção à Copacabana e à São Cristóvão que trafegam por ali. O encontro das bicicletas que vêm das ciclovias da Lagoa com os pedestres equipados em roupas de ginástica e babás uniformizadas resulta caótico naquelas tentativas ousadas de cruzar o semáforo ainda com a luz vermelha.
Aquele tapete de sombra, de falta de luminosidade, peculiar ao primeiro trecho da rua, fica para trás com o clarão provocado pela bonita Praça General Álcio Souto, que tem um Quintino Bocaiúva – o jornalista e político – de bronze no seu centro rodeado por um jardim circular. A vista livre para o Corcovado enfeita a praça como um pintura emoldurada serve de decoração para a sala de estar de uma residência. Enquanto isso, o 157 contorna a praça, já com todos os passageiros da Fonte da Saudade embarcados, e engata na Rua Humaitá, rumo ao Centro do Rio.
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FONTE DA
SAUDADE
Um tal de Mestre Bernardo, arrendou por nove anos 100 braças de terras
que estavam devolutas, por carta de 19 de dezembro de 1612. Eram no fim da
"praia da Lagoa", onde antes viveu Baltazar de Azevedo, até junto ao morro da
"Saudade", vindo da Lagoa para a cidade. É onde hoje existe a região denominada
"Fonte da Saudade". A "Fonte da Saudade" era assim chamada porque no princípio
do século XIX ali lavavam roupa lavadeiras portuguesas, que cantavam fados
relembrando com saudades a terra distante.
Há referências diminutas a outros engenhos na Lagoa, todos de localização
imprecisa e escassas informações. Segundo A. de Mello Moraes, possuíam também
engenhos na região: Martim Gonçalves, rico comerciante com casas na rua da
Alfândega; Pedro de Souza e Brito, Capitão de Infantaria (1584-16??), era filho
de João Pereira de Souza Botafogo (1540?-1605), dono do que é hoje o bairro de
Botafogo; e Pedro Fernandes de Mello. Todos os seus engenhos foram de efêmera
duração.
Em 06 de maio de 1614, Francisco Gomes requereu aforamento de mais
terras ao "Conselho da Câmara" para
ter mais largura que as que possuía Antônio de Almeida, porquanto tinha feito
casas, roças, canaviais e um engenho de cana. Parece que esse Francisco Gomes
devia alguma, pois os "Oficiais da Câmara" foram à sua fazenda e botaram tudo
abaixo, derrubando o engenho, com pena de seis cruzados de o levantar de novo.
Foi-lhe proibido de plantar cana e dado um prazo de um ano para se mudar.
A 24 de dezembro de 1616, Francisco Caldas, "Cavaleiro Fidalgo D`El Rei",
requereu ao "Conselho da Câmara" aumento de terreno para acréscimo do engenho de
açúcar que ele fundou nas terras da Lagoa. A Câmara deu o aforamento, mas tudo
leva a crer que o engenho não foi adiante e logo se tornou mais uma extensão das
terras de Varela.
TÚNEL
REBOUÇAS
O Túnel Rebouças era uma antiga aspiração dos cariocas. Projetado
inicialmente pelo urbanista francês Alfred Agache em 1928 para o Prefeito Prado
Júnior, só saiu do papel em 1948, na administração do Prefeito Marechal Ângelo
Mendes de Morais (1946/1951). Em 1950 as obras pararam. Foram retomadas em 1961
pelo Governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda (1914-1976), que o
inaugurou parcialmente em 1965. Foi totalmente concluído em 1967 pelo Governador
Francisco Negrão de Lima (n.1908), sendo considerado à época o maior túnel
urbano do mundo, com 2.700 m de
extensão, dividido em duas partes, formando dois túneis gêmeos (André e Antônio
Rebouças), cortando os bairros do Humaitá, Jardim Botânico, Lagoa e Cosme Velho,
ligando-os aos do Estácio, Rio Comprido e Tijuca, passando por debaixo do maciço
do Corcovado. Conta-se que o Governador Lacerda só não inaugurou totalmente o
túnel em 1965 para espicaçar com seu rival Roberto Marinho, que teria suas
terras do Cosme Velho muito valorizadas pelo empreendimento.
Ainda em 1971, Francisco Negrão de Lima, Governador do Estado da
Guanabara (1966-1971), no apagar das luzes do seu governo, intentou passar um
decreto permitindo o aterro total da
Lagoa Rodrigo de Freitas, para ali se fazer um novo bairro, beneficiando
determinado construtor famoso que almejava tal quinhão há anos. Outro projeto
engavetado... .
Em 19 de fevereiro de 1988, grandes chuvas castigaram a Cidade do Rio de
Janeiro. Por fatalidade, uma comporta dentro do "Jóquei Clube", que represava o
"Rio dos Macacos" estava fechada, fazendo-o transbordar e inundar o Jardim
Botânico, causando enorme destruição. Levou-se dez anos e três administrações
(Sérgio Bruni - 1988/89, Wanderbilt Duarte de Barros - 1989/92, e novamente
Sérgio Bruni - 1992/98), para reparar os estragos.
Hoje o “Jóquei" possui avançado sistema para impedir que isso se
repita.
IGREJA DE
SANTA MARGARIDA MARIA - PÇA. FREI SOLANO - LAGOA
Elegante templo em estilo neocolonial tardio projetado por Fernando I.
Lemos em 1948, e concluído dez anos depois. A fachada foi inspirada nas antigas
igrejas hispânicas da Califórnia. A abertura do Túnel Rebouças em 1965 deu
especial relevo ao conjunto, valorizado pela existência de áreas livres no
entorno.
OBRA DO
BERÇO - R. CÍCERO GÓIS MONTEIRO, 19/AV. EPITÁ. PESSOA
Edifício destinado a serviços sociais de orientação à maternidade e
abrigo a crianças até dois anos de idade, assume importância fundamental por se
tratar da primeira obra construída de Oscar Niemeyer (1937). O conjunto, situado
em terreno de esquina às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, é composto por
dois blocos: frontal, com quatro pavimentos e fachada principal (voltada para
oeste) protegida por “brise-soleil” vertical móvel; e posterior, com dois
pavimentos, e predominância horizontal. Este bloco possui circulação por rampas
para facilitar a locomoção de carrinhos e crianças. O prédio é tombado pela
Municipalidade.
Professor Milton Teixeira
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